DIGITE ABAIXO SUA BUSCA

CINE HORROR entrevista: Joel Caetano

Por: Val Oliveira

Joel Caetano é diretor de curtas premiados no Brasil e exterior, além de ator, produtor e roteirista. Ele tem uma filmografia que merece a atenção de todo fã de cinema fantástico, e tem uma grande participação na história da Mostra CINE HORROR, tendo seus filmes exibidos desde a sua primeira edição, em 2016. Em 2023, Joel foi um dos finalistas do 1º Prêmio da Mostra CINE HORROR, tendo ficado em segundo lugar pelo seu ótimo curta “Arapuca”. Aqui nesta entrevista, vamos conhecer um pouco mais sobre o diretor e sua carreira.


 


1 – Joel, quando começou o seu gosto pelo cinema fantástico?


Joel Caetano: Na minha tenra infância, ouvi muitas histórias fantásticas de meu falecido avô Miguel. Ele juntava os netos para contar "causos" que ouvia quando criança em sua terra natal, Pernambuco. Eram relatos sobre lobisomens, "visagens", além de criaturas folclóricas da região como o "Papa Figo" entre outros. Ele até jurava ter conhecido Lampião, mas isso é outra história. Com o passar do tempo, me interessei por quadrinhos, eu lia de tudo, Disney, Turma da Mônica, Tex, Conan, Fantasma, heróis da Marvel e DC e principalmente histórias de terror em revistas como Calafrio e Spektro. Todo esse imaginário de histórias fantásticas se solidificou ainda mais quando comecei a ver filmes. Na década de 1980, tínhamos acesso a muita coisa pela tv aberta, foi por aí que vi filmes como Evil Dead II, A hora do pesadelo, Star Wars, Os Caça-fantasmas, Robocop - O policial do Futuro, Alien - O oitavo Passageiro, Sexta-Feira 13, Halloween, Labirinto - A Magia do Tempo, Os aventureiros do Bairro Proibido, Gremlins entre tantos outros. Tudo isso me fez buscar nas locadoras de forma compulsiva, fitas de filmes do gênero fantástico, especialmente ficção científica e terror. Quando fui realmente estudar audiovisual na faculdade, pude ter contato com ainda mais conhecimento sobre cinema, e apesar de me aprofundar todo tipo de gênero, mantive meu interesse por  fantástico, ao qual sempre fui extremamente apaixonado.


2 - O que te influenciou a ser um diretor voltado ao cinema fantástico?


JC: Eu gostava muito do gênero, mas achava muito distante a possibilidade de fazer filmes, por causa do custo. Quando surgiu o advento do cinema digital, minha mente explodiu. Comecei a ver vídeos na internet, mesmo antes do Youtube, de pessoas que faziam filmes de forma independente, principalmente fora do país. Eu tinha muito interesse em aprender a fazer efeitos especiais, tanto visuais quanto práticos, esse desejo aliado a minha vontade de contar histórias e a possibilidade de usar uma câmera caseira para produzir, foram o início de tudo. Depois comecei a conhecer um pessoal daqui que já fazia filmes também, e isso foi empolgante. Cineastas como Petter Baiestorf, Felipe M. Guerra, Pepa Filmes, Gurcius Gewdner, Davi Pinheiro, Rodrigo Aragão, Rodrigo Brandão, Rubens Mello, Geisla Fernandes, Dimitri Kozma, Kapel Furman, Dennisson Ramalho entre tantos outros que produziam filmes independentes (obviamente cada um de seu jeito e estilo). A partir daí, apesar de não fazer parte de nenhum grupo,  isso me inspirou a continuar fazendo mais e mais filmes. 


3 – Qual foi o seu primeiro filme? Qual a percepção que você tem de suas primeiras obras, com a sua visão atual?


JC: Meu primeiro filme foi AFRODITE (2001). Um curta onde uma briga de casal acaba em um final sangrento e inusitado. Meus filmes tinham muito uma pegada de humor, muitas vezes mais exagerado, como em "GATO" (2009) por exemplo. O que percebo hoje, além do aprimoramento técnico e narrativo, é que as temáticas psicológicas me atraem mais do que só o susto ou humor. Mas são fases, eu tenho filmes bem recentes que possuem bastante humor, como "CASULOS" (2017) por exemplo. Tenho um certo senso de humor peculiar, e mesmo que faça filmes mais densos, se olhar bem no fundo, há algo que julgo engraçado, uma ironia ou sadismo com os personagens. Considero o humor irmão do terror, sabendo usar ambos em nossas histórias, creio que podemos obter algo bem especial.



4 - Você tem lançado curta-metragens que tem tido bastante circulação em festivais. Qual o seu filme mais exibido e qual o que te deu maior retorno enquanto diretor?


JC: Meus filmes mais exibidos são JUDAS com 104 festivais e mostras, seguido de CASULOS com 99  e ENCOSTO com 98. Todos eles foram premiados em diversas categorias, mas a resposta do ARAPUCA, meu mais recente trabalho tem sido incrível. O filme foi exibido em 26 festivais e ganhou 26 prêmios (uma média de 1 prêmio por festival) e está há apenas 6 meses no circuito de festivais. É um resultado ótimo, e por ser meu primeiro com lei de incentivo, fico feliz em ter aproveitado bem os recursos a que tive acesso, com uma história que ao meu ver entretém, mas também nos faz refletir sobre temas importantes da nossa sociedade. 


 5 - Você teve contato com diretores de diversas gerações, como o grande mestre José Mojica Marins e Rodrigo Aragão. Como foi a experiência de dividir o espaço com duas referencias no horror nacional?


JC: São artistas incríveis, é mesmo uma honra enorme ter tido a oportunidade de trabalhar com ambos. Estar no set com outros diretores é muito divertido para mim, ainda mais pessoas como o Aragão e Mojica que são muito abertos a trocas. É um aprendizado constante. Posso incluir nessa lista de pessoas que adorei trabalhar também como o Marco Dutra, com quem já fiz uma série chamada "Noturnos" e um longa, o "Enterre seus Mortos", ambos trabalhos como coordenador de efeitos visuais e o Aly Muritiba, com quem trabalhei no filme "Barba Ensopada de Sangue", na mesma função. É sempre revigorante poder ver a visão de cada um desses artistas, que ao meu ver, são referência no cinema de gênero mundial. 



6 – Você tem diversificado a linguagem de seus filmes, tendo trabalhado não só com atores, mas também com animação. Essa diversificação é uma vontade que surgiu espontaneamente, ou você já vinha planejando trabalhar com outro formato?


JC: Eu gosto de experimentar coisas. O aprendizado é o que mais me motiva a fazer cinema. Cada pessoa que tenho contato no set é uma oportunidade de trocar aprendizado, e isso é sempre incrível. Além do que foi citado, tenho me interessado muito por animação em stop-motion e já estou, aos poucos, produzindo um segundo filme com essa técnica. É como começar do zero, e isso é muito excitante. Já faço cinema há muitos anos e sempre busco algo que me tire de uma posição de conforto. Adoro sentir o frio na barriga em cada produção que faço. É arriscado, mas não tenho medo de me comprometer em tentar algo novo.


7 - Além de diretor e roteirista, você também é ator, tendo participado em suas produções, mas em produtos de outros diretores, como A Noite do ChupaCabras, de Rodrigo Aragão (2011), onde foi o personagem principal. Como foi a experiência de estar do outro lado das câmeras?


JC: Foi ótima. Isso me ajudou a compreender melhor a construção do ator. Quando escrevo, busco nesse meu conhecimento ferramentas para criar personagens e ao dirigir alguém, a troca se torna mais fluida. Aconselho todo diretor a ter uma experiência como ator também, vai mudar sua ótica de como lidar com esse profissional que está na linha de frente de todo projeto cinematográfico.



8 – Você tem ministrado oficinas de cinema, efeitos especiais e animação. Pode nos falar sobre esta atividade, e quando surgiu a idéia?


JC: Já faço isso há mais de 15 anos e é sempre muito prazeroso. A oportunidade surgiu quando participamos, eu e Mariana Zani, minha sócia, participamos do primeiro Cinema de Bordas no Itaú Cultural em São Paulo. Os organizadores do evento na época nos chamaram para dar uma oficina de cinema e mesmo sem experiência nenhuma, topamos e foi muito bom! De lá para cá não paramos. Já ministramos oficinas e workshops em faculdades públicas e privadas, em eventos de cultura geek, no Sesc em diversas cidades e estados e esse ano começamos uma parceria muito interessante com o MIS-SP, onde já estamos na terceira oficina com a quarta agendada para julho deste ano. As oficinas são uma renovação para mim. Poder motivar jovens, crianças e adultos a terem uma experiência na realização cinematográfica é sempre muito gratificante. Eu aprendo muito com cada pessoa que passa por minhas aulas, além de fazer novos amigos que já estão na área ou serão futuros profissionais. É uma atividade que quero sempre poder realizar pois gosto muito da experiência. 


9 – Atualmente você tem divulgado sua mais recente produção, o curta “Arapuca”. Considero o filme sua obra mais madura e refinada. Como seu deu o desenvolvimento? Como tem sido a recepção?


JC: “Arapuca” é um projeto de curta-metragem que parte de uma pesquisa intensa a respeito de conflitos existenciais, nesse caso, promovidos por questões como doenças degenerativas na terceira idade, orientação sexual e conflito de gerações. Tudo isso abordado por meio de um relacionamento conflituoso entre pai e filho. Na história, o octogenário João sofre de uma doença que o faz ignorar completamente a existência de seu filho Marcos, um homem ansioso e carente de quase 50 anos que largou tudo para cuidar do pai enfermo mesmo depois de terem um passado nebuloso juntos.

A obra discursa sobre a invisibilidade de Marcos e na busca por uma retratação praticamente inalcançável dos atos cometidos por seu pai no passado. É um mergulho sensorial em um universo denso e conflituoso que pretende levar o espectador a participar de forma profunda e reflexiva da angústia desses personagens. O desejo de confrontar seu pai transforma Marcos no último homem de um mundo condenado a desaparecer com a inevitável perda de memória de João.

Toda a ideia desse filme veio da minha preocupação em relação ao envelhecimento de meus pais, que apesar de serem pessoas saudáveis, já possuem uma idade que pode ser considerada avançada. Sabemos que certas dificuldades começam a surgir com a idade, e o que mais me assusta é a perda da sanidade. Como gosto de trabalhar meus medos, busquei nessa primeira fagulha a inspiração e comecei a imaginar esses personagens, recheando essa ideia central com histórias reais que li e ouvir ouvi, e que achei pertinente misturar para criar essa trama. Foram anos tentando editais e aprimorando o roteiro para chegar nesse resultado junto com a equipe que participou do filme. Nosso projeto passou no PROAC em 2021, um ano em que disputamos com mais de 1500 projetos de curta-metragens, o que considero uma vitória incrível. É uma obra da qual me orgulho muito, e o melhor resultado são as discussões que o filme suscita após as exibições, o que muitas vezes chega a ser emocionante. É um filme também que pude firmar parcerias profissionais e pessoas importantes que, se tudo der certo, irão estar comigo em novos trabalhos daqui para frente.



10 - O cinema nacional, no geral, não valoriza cinema de gênero, ainda mais ficção e horror, com um mercado mais voltado para comedias, biografias e dramas. Acha que essa percepção do mercado pode mudar? Quais ações se mostram necessárias para que o cinema fantástico encontre um publico maior?


JC: Acho que estamos caminhando para uma melhora nesse sentido e isso tem muito haver com os serviços de streaming. Há uma demanda maior por materiais nacionais e com essa demanda, há uma necessidade de diversificação das temáticas, e o cinema fantástico está entre elas. Depende bastante de nós, produtores e artistas enxergarmos esse potencial mercado para aproveitarmos e começarmos a manter uma constante produção de qualidade, que atenda não só o público aficcionado com o gênero, mas o mais casual. Com isso, e aproveitando novas gerações que não possuem um olhar tão negativo sobre o cinema nacional, acho possível revertermos esse quadro. 


11 – Joel obrigado pela atenção. O espaço é seu para suas mensagens finais.


JC: Eu agradeço mais uma vez o espaço aqui no Cine Horror para poder falar de cinema fantástico, esse gênero que tanto amo. Peço para quem estiver lendo essa entrevista que procure conhecer o cinema fantástico nacional, há filmes incríveis a serem explorados, vocês vão se surpreender. Se quiserem, me acompanhem nas minhas redes sociais @joelcae e @rzp_filmes. Um grande abraço para todos!


Entrevistas
https://www.cinehorror.com.br/entrevistas/cine-horror-entrevista-joel-caetano?id=1119
| 455 | 26/02/2024
Joel Caetano é diretor de curtas premiados no Brasil e exterior, além de ator, produtor e roteirista.
VEJA TAMBÉM

Rodrigo Aragão: "O imaginário popular latino americano é uma fonte quase inesgotável de boas histórias"

Entrevistamos Rodrigo Aragão, um dos maiores representantes das produções de horror no país atualmente, e que está lançando nacionalmente "A MATA NEGRA", quinto longa de sua carreira.

Desenvolvimento:
Design gráfico, sites e sistemas web.
Contate-nos!